quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Coragem, eu sei que você pode MAIS!


Balanço do MAIS sobre o 2º CONJPT

O 2º Congresso Nacional da Juventude do Partido dos Trabalhadores (JPT) foi realizado entre os dias 12 e 15 de novembro. O Congresso Nacional teve a participação de quase 700 delegados, eleitos através das etapas que aconteceram em todos os estados do País. Quanto às etapas municipais, foram mais de 1500 Congressos, demonstrando a força e a capilaridade da JPT.

Esse congresso depositou uma expectativa de consolidar o modelo de organização da JPT e aprovar um regimento interno que tirasse as resoluções do primeiro congresso do papel. Mas o 2º CONJPT foi muito aquém dessas expectativas que o conjunto da Juventude do PT tinha, que saindo de uma gestão muito longa de quase 3 anos e meio, esperava um grande resultado político.

Embora a mobilização tenha sido satisfatória, este congresso apresentou diversos limites do modelo congressual para eleger a direção. Avaliamos que debater a política no mesmo espaço de eleição da diretoria prejudica principalmente a política. Além disso, não parece interessante aos jovens filiados ao PT o modelo “retro” aplicado nas etapas municipais e estaduais. No Congresso nacional, havia uma expectativa de um debate mais qualificado, por conta das discussões que antecederam a etapa nacional. Mas o modelo ao qual o 2º CONJPT foi organizado não contribuiu para isso. Havia apenas grandes mesas com temas importantes, mantendo o modelo catedrático e monocrático já estabelecido que lembra os velhos seminários, em que uns falam e os outros apenas tem o direito de ouvir e concordar.

Desde o começo da construção do 2º Congresso da JPT, todos e todas que construíram a tese “Coragem, eu sei que você pode MAIS” e apoiaram a candidatura do companheiro Ronaldo, membro da coordenação nacional da Mensagem ao Partido, tinham como perspectiva a consolidação de um pacto político para a JPT. Pacto esse que leve a superação do tradicionalismo impregnado na política e coloque a JPT como referência de um debate estratégico sobre socialismo, transição geracional e sair desse engessamento que só faz grandes análises de conjuntura e avanços do governo, mas pouco caminha com a juventude brasileira e seus sonhos de transformação.

Não acreditamos, apesar de reconhecermos todos os avanços dos nossos governos, que somente debater o governo possa ser a engrenagem para agregar novos militantes, tampouco ser uma ferramenta para empolgar os que já estão em nossas fileiras e por isso apresentamos um debate diferenciado, sintonizado com o nosso tempo e com nossa juventude para estabelecer uma atuação ousada e transformadora. Na fala do Presidente Nacional do PT, Rui Falcão, houve sinalizações nesse sentido. Conforme Rui Falcão, a JPT precisa apresentar-se para a juventude brasileira como uma juventude organizada, desburocratizada e que não reproduza as práticas da velha política brasileira.

Participação da Tese “Coragem: Eu sei que você pode MAIS!”

Desde o começo do processo de mobilização ao Congresso, nossa tese conseguiu agregar diversos segmentos da Mensagem ao Partido. Tivemos como principais características, o respeito à pluralidade, as construções locais e o combate à prática hegemonista. Nossa tese agregou mais de 10 correntes regionais da Mensagem ao Partido, além do MAIS e da simpatia de dirigentes partidários e de movimentos que caminharam conosco até o último dia do Congresso.

Além do apoio de um amplo setor da Mensagem ao Partido, logo no primeiro dia de Congresso, tivemos a honra de receber o apoio do movimento “Inaugurar um Novo Período”. Com uma grande pactuação na política, sem acordos por cargos ou que representassem a cultura política que queremos derrotar dentro do PT, esta aliança consolidou nosso campo como o segundo campo dirigente no 2º CONJPT.

A unidade da Mensagem ao Partido foi uma hipótese construída até o ultimo dia de Congresso, e só encerrou-se na inscrição de chapas, quando oficialmente consolidou-se a aliança da JCNB com um setor minoritário da Mensagem ao Partido. Na nossa avaliação, um grande erro político, pois uma chapa com um grande protagonismo da Mensagem ao Partido não tinha como objetivo derrotar um ou outro setor dentro do Congresso, mas apresentar a juventude brasileira uma alternativa socialista e que representasse a quebra dos paradigmas que afastam a juventude do PT, e por consequência da política.

Resultado do Congresso:

Com o cenário acima desenhado, o 2º CONJPT apresentou a seguinte conformação de chapas e resultados:

Chapas

Chapa 2 CNB e DS– 411 votos

Chapa 3 MAIS e Inaugurar um novo período - 93 votos

Chapa 5 MPT, PTLM e Novos Rumos - 74 votos

Chapa 1 AE e Militância socialista - 71 votos

Chapa 4 O Trabalho - 4 votos

Candidaturas a Secretaria Nacional de Juventude

Jefferson Lima- CNB - 347 votos

Ronaldo Pinto - MAIS - 87 votos

Tassia Rabelo - MPT - 83 votos

Bruno Elias - AE - 78 votos

Joana Parolli – DS – 70 votos

É importante afirmar que o MAIS construiu uma atuação política de forma ampla, corajosa e exclusivamente por jovens, afirmando o nosso compromisso real com a transição geracional. Não somos um grupo de iluminados, tampouco detentores da verdade absoluta, mas temos convicção de que o melhor caminho no Congresso da JPT foi o que traçamos: o do diálogo com um campo mais identificado com uma juventude democrática, de movimento real, sem cair no hegemonismo ou no pragmatismo. Construímos uma intervenção combativa, propositiva, ousada e sintonizada com os anseios daqueles que tiveram coragem e construíram essa grande vitória conosco.

No próximo período, caberá à JPT intensificar sua relação com a juventude brasileira e a organização das instâncias municipais e estaduais da JPT. Não estaremos à altura de renovar os sonhos petistas e dirigir a transformação do Brasil e do mundo se nos mantivermos com Congressos cartoriais e gestões superficiais. A segunda geração petista precisa renovar a ousadia da primeira e puxar a linha do horizonte, com grandes mobilizações de rua, nas universidades, junto à juventude trabalhadora e desempregada. O sonho de um outro mundo possível ainda se faz necessário.

Acreditamos na juventude, no PT e achamos que juntos na luta socialista podemos muito MAIS.

Viva a Juventude, viva o PT!!!

“Nunca se vence uma guerra lutando sozinho
Cê sabe que a gente precisa entrar em contato
Com toda essa força contida e que vive guardada
O eco de suas palavras não repercutem em nada

É sempre mais fácil achar que a culpa é do outro
Evita o aperto de mão de um possível aliado, é...
Convence as paredes do quarto, e dorme tranqüilo
Sabendo no fundo do peito que não era nada daquilo

Coragem, coragem, se o que você quer é aquilo que pensa e faz
Coragem, coragem, eu sei que você pode mais”.

Coordenação Nacional do Movimento de Ação e Identidade Socialista
Contato: nacional@maispt.org

segunda-feira, 20 de junho de 2011

A marcha das marchas










por Louise Caroline

De onde vêm e pra onde vão os recentes movimentos “Marcha da Maconha”, “Marcha da Liberdade”, “Marcha das Vadias”?
Recentes manifestações políticas ocuparam as ruas do país e exigem reflexões sobre seu caráter. Tão excêntrica quanto as Marchas parece ser a compreensão sobre elas. À primeira vista, não cabem os padrões históricos que definem os Movimentos Sociais desde a década de 80 e talvez estejamos diante de um novo momento de lutas sociais, em diálogo com a nova cidadania interativa originada pelas estabilidade democráticas e pela conexão virtual globalizada.
Evidente que a confirmação dessa hipótese depende de estudos e análises mais profundos, a que não se pretende esse texto. Quer-se apenas despertar a necessidade dessa reflexão, política e acadêmica, trazendo foco às Marchas. Para isso, apresento aqui quatro interessantes características dessas recentes movimentações.
Diferentemente das lutas pela democratização política, por melhores salários, ou garantia dos direitos básicos, que impulsionaram a ação dos movimentos reivindicatórios brasileiros no final do século XX, as atuais Marchas têm por foco direitos individuais que, historicamente, fariam parte da pauta liberal e não da pauta socialista ou social-democrata, às quais estariam ligadas as lutas coletivas tradicionais por direitos.
As novas ações se tratam, por mais que haja relação com a busca de direitos, de questões relacionadas à liberdade individual de fazer, ser, usar o que quiser, sem limitações do Estado e com garantia de respeito coletivo às opções individuais.
A complexidade de compreensão do tema começa na tentativa de enquadrá-lo aos padrões típicos de classificação das mobilizações sociais ou mesmo da classificação jurídica dos Direitos Fundamentais. Padrão típico, reafirma-se, é o que as Marchas não seguem.
Senão, vejamos:
As reivindicações das Marchas poderiam ser compreendidas no bojo da 1a geração de direitos, por serem direitos civis e políticos, com conteúdo liberalizante (liberdade para usar maconha, liberdade para se relacionar com pessoas do mesmo sexo, liberdade para se vestir e se comportar), típicas liberdades clássicas, negativas ou formais. Entretanto, a ação do Estado não é dispensada, ou seja, as Marchas não querem que o Estado simplesmente deixe de agir e permita que as pessoas livremente dirijam suas vidas. Querem livremente dirigir suas vidas sim, mas querem que o Estado garanta isso, o que se aproxima em muito dos direitos de 2a geração, direitos sociais e culturais, que abrangem as liberdades positivas, reais. Não é, portanto, uma pauta que busca inação do Estado, mas que busca ação do Estado para que sua liberdade individual seja garantida e respeitada pelo conjunto da sociedade. A Marcha da Maconha quer legalizar a droga, não quer só o direito de usá-la, mas que haja regulamentação da produção, do consumo, apoio aos usuários na rede pública de saúde. A Marcha da Liberdade, originária das proibições judiciais de realização da Marcha da Maconha mas logo redesenhada como um amplo movimento pelas liberdades individuais, defende não apenas o direito ao amor livre, mas a regulamentação jurídica dos direitos de união civil e, ainda, a criminalização da homofobia, ou seja, uma lei que proíba e puna a discriminação contra os homossexuais.
Ainda, também, não há como excluir essas pautas dos direitos de 3a geração, comprometidos com a solidariedade, a paz e os direitos humanos.
Resumidamente, são movimentos com pautas individuais liberalizantes que, ao mesmo tempo, exigem ação estatal para efetivação dessas liberdades. São movimentos com pautas individuais, de direitos fundamentais ao ser, mas também intimamente ligados às liberdades positivas de aprofundamento da igualdade e ainda em sintonia com os direitos de solidariedade e titularidade coletiva.
Ou seja, essa primeira característica já demonstra a novidade, complexidade e excentricidade dos novos movimentos em curso.
Uma segunda característica de destaque é o perfil de quem organiza e quem marcha. Predominam jovens, universitários/as, brancos/as, de classe média. Ou seja, um público com direitos básicos razoavelmente adquiridos, mas incomodado por uma limitações à liberdade de exercer determinado comportamento (evidentemente, também relacionado a direitos).
A elevada qualidade de vida dos/as agentes dessas novas lutas, associada à conjuntura política de estabilidade democrática e livre expressão, parece permitir que se abram os olhos a questões não primárias, que, apesar de relevantes, não ocuparam lugar central anteriormente pela urgência de outras conquistas básicas.
Interessante que as Marchas brasileiras têm pontos de contato com os movimentos por liberdade sexual, libertação das mulheres, livre uso de drogas que sacodiram os EUA e a Europa nas décadas de 60/70. Note-se que ao mesmo tempo aconteciam mudanças profundas na política institucional e avanços consideráveis na garantia dos direitos básicos nesses países, assim como vemos no Brasil e na América Latina recentemente.
Suspeita-se, então, haver uma relação entre as conquistas dos direitos primários para a parcela majoritária da população com o levante de questões individuais por uma parcela mais escolarizada e com direitos já consolidados.
Dessa forma, verificamos que as Marchas não são movimentos de classe, nem de massas, mas que surgem após avanços sociais para a classe excluída, como se dissessem: “agora que há democracia, comida, saúde e educação queremos ir além, queremos ter prazer, estilo, espaço e respeito”.
A segunda característica, portanto, também apresenta peculiaridades significativas pelo protagonismo de grupos geralmente apáticos às questões políticas e fora do contexto de exclusão social que organizou as lutas do século passado.
A terceira característica percebida é a ausência, ou, algumas vezes, participação minoritária, das organizações tradicionais de representação como os partidos políticos, movimentos sociais institucionalizados, entidades estudantis e sindicais.
As Marchas parecem desejar personalidade própria. A Marcha da Maconha, de longe a mais consolidada, tem fóruns próprios de organização, com reuniões da Marcha, coordenadores da Marcha, representantes da Marcha. Mesmo que haja militantes partidários e parceria ou participação dos grupos tradicionais, esse não é o público majoritário e tampouco o ambiente é muito acolhedor a eles. Há, por parte desses/as jovens em marcha, inclusive, certo preconceito com os grupos tradicionais e, geralmente, pede-se a não utilização de bandeiras partidárias ou revela-se certa hostilidade diante delas. Na maioria das vezes, os/as ativistas em marcha participam de sua primeira manifestação política e acreditam estar fazendo algo tão novo e revolucionário que não deveria ser “contaminado” pela burocracia dos partidos e entidades tradicionais.
Ao mesmo tempo, os principais partidos de esquerda do país e as entidades estudantis e sindicais mais atuantes também passam por um período de refluxo social advindo da institucionalização de suas principais lutas. Com a chegada do PT à Presidência da República e o crescimento dos campos progressistas nos parlamentos, prefeituras e governos, o campo de esquerda está ocupado com a disputa institucional pela efetivação de suas bandeiras históricas, aproveitando o momento para aprovar leis e programas relacionados a direitos básicos, inclusive em diálogo com as pautas das próprias Marchas. Mas sua concentração na ação institucional afastou esse campo do contato mais direto na disputa ideológica dessa nova geração, sendo evidente o distanciamento do PT e dos movimentos tradicionais com a identidade em formação nas universidades e nas redes sociais do mundo virtual.
A imaturidade política dos que marcham associada à institucionalização do campo progressista tradicional – sem querer impor valor negativo a uma ou outra leitura, faz com que as Marchas também tenham certa imprecisão estratégica.
Afinal, marcha-se com qual objetivo de longo prazo? Contra quem ou contra o que se deposita o foco das marchas? No jogo político das decisões públicas – do qual saem as leis e ações estatais – estão identificados os aliados e adversários? Ou as Marchas apenas querem despertar atenção para o tema e deixar a estratégia política a outros atores? Essas lutas pontuais estão conectadas a alguma luta política mais geral? Deveriam estar? Como?
Enfim, o que importa ressaltar nessa terceira característica é que as Marchas estão à margem das discussões mais gerais, não são protagonizadas pelos grupos tradicionais de organização coletiva e abrigam pessoas das mais diversas matizes ideológicas.
A quarta e última característica é o meio pelo qual essas bandeiras ganham adeptos e por onde as Marchas são convocadas: a internet. As redes sociais permitem a elevação de uma questão desconhecida a uma adesão nacional, até mundial, em questão de horas. Evidente que a fragilidade da ascensão é a mesma do declínio. A efemeridade da internet e a facilidade de aderir às causas, cria também o militante virtual que aperta o botão mas não sai de casa. Bom exemplo é o Churrascão da Gente Diferenciada, protesto contra os ricos paulistanos de Higienópolis que recusaram o metrô no bairro para evitar o trânsito de “gente diferenciada”, que embora não seja Marcha também pode ser enquadrado nas quatro características aqui elencadas. Em uma semana, a página no Facebook do “Churrascão” registrou mais de 50 mil apoiadores, mas no dia reuniu aproximadamente dois mil (o que não deixa de ser considerável).
De toda forma, as redes sociais têm sido espaço de mobilização de ideias e debates que não se pode ignorar. Muito rapidamente pessoas de todos os lugares estabelecem redes de apoio ou oposição que começam a interferir na vida política real do país.
Grandes meios de comunicação já utilizam o Twitter como fonte, não só pelas declarações pessoais, mas pelo Trending Topics (os tópicos mais populares no momento). Partidos e Movimentos também se mobilizam para emplacar suas hashtags (marcação, termo padrão de mobilização na rede) e comemoram a entrada nos TT’s como significado de amplo apoio à sua causa.
As Marchas chegam rapidamente ao TT’s, bem como se pulverizam em velocidade altíssima pelo Facebook. A Marcha da Liberdade de São Paulo, ocorrida após a repressão policial à Marcha da Maconha, mobilizou mais de 3 mil pessoas em uma semana. E em um mês já ocorria em dezenas de cidade em todo país.
Em tempos de apatia política, o papel da internet e das redes sociais na mobilização de causas e movimentos é um tema relevante, que já vem sendo estudado, mas que agora precisa englobar as Marchas.
Conclusão
Como não se pretende esgotar o debate, ao contrário, suscitá-lo, farei considerações breves acerca dos quatro pontos, não sem antes informar de onde se fala. Sou militante partidária, petista, organizada há mais de 10 anos e sem qualquer intenção de deixar de sê-lo. Ao mesmo tempo, sou tuiteira, ativista empolgada de todas Marchas e profundamente comprometida com as pautas levantadas por esses movimentos.
Assim, falo de um lócus favorável às Marchas e também aos partidos, trazendo comigo reflexões que partem de um e de outro ponto de vista, sendo por isso, talvez, que minhas conclusões marchem em favor do diálogo entre esses dois mundos.
Sobre o primeiro ponto característico levantado no texto, cabe destacar que as lutas individuais, por direitos de liberdade e igualdade, também compõem direitos sociais e coletivos. Ou seja, não é problema exclusivo de um indivíduo se ele pode ou não casar com quem queira, mas um problema da sociedade, não restrito aos gays ou beneficiários diretos dessa política. A opressão a grupos minoritários – e isso é límpido na Teoria Geral do Direito ou nos registros históricos, políticos e sociológicos – não atinge apenas os membros dos grupos minoritários. A opressão de um grupo social atinge o equilíbrio de toda sociedade e joga contra a justiça do sistema. Embora não sejamos aqui capazes de definir exatamente de que tipo de direitos se compõem essas lutas, importa ressaltar que são causas individuais porém não individualistas e que suas consequências atingem o conjunto da sociedade. A Marcha da Maconha, por exemplo, é apoiada e mobilizada não só pelos usuários da substância, mas também por muitos que questionam o poder do tráfico e acreditam que a legalização poderá enfraquecer o crime. Ou seja, por mais que sejam pautas de liberdade individual, são temas de ampla repercussão em toda sociedade e que não dizem respeito apenas aos que estão diretamente vinculados.
No que diz respeito à segunda característica, não parece desimportante uma luta política pelo fato de que ela não seja de classe ou de massas. Ao contrário, a mobilização da classe média em favor de pautas que colaborem com a igualdade, a justiça e com questões intimamente ligadas ao equilíbrio de direitos é uma vitória, dado que o outro comportamento possível seria a omissão ou o favorecimento da opressão, da exploração, da desigualdade. O caso de Higienópolis foi flagrante: a classe média e alta da juventude paulistana foi quem protestou contra o preconceito dos moradores do bairro em relação aos pobres e trabalhadores, “gente diferenciada”, que poderia contaminar seu bairro. Seria preferível que essa juventude “pop cult” se somasse à adjetivação preconceituosa dos os moradores do bairro? Evidente que não. A participação desse segmento nas causas políticas mais progressistas, por mais limitações e peculiaridades que possa ter, é uma conquista relevante na caminhada por uma sociedade menos hipócrita e egoísta fundamental aos avanços mais concretos para a classe trabalhadora. Não parece, portanto, desprezível a colaboração dessa juventude classe média ao outro mundo possível que ao longo dos anos tem motivado a luta classista por uma sociedade de desconcentração de renda e cidadania plena.
Quanto à relação entre as Marchas e as questões políticas mais gerais, parece evidente que os direitos individuais estão relacionados ao sistema político e econômico, sendo impossível descolá-los. Uma sociedade patriarcal, concentradora de renda ou teocrática, por exemplo, dificilmente permitirá o casamento gay ou a liberdade sexual das mulheres. Ao mesmo tempo, uma sociedade de distribuição das riquezas sem equiparação dos gêneros, livre sexualidade ou comportamento, dificilmente produzirá um sentimento de igualdade entre seus membros. Ou seja, mesmo descolados das questões políticas mais gerais e determinantes, as Marchas e lutas por liberdade podem, ainda que sem esse objetivo claro, contribuir para o questionamento do sistema sócio-econômico, no momento em que desestruturam valores e crenças que alicerçam o grande sistema. De toda forma, entretanto, a ausência de uma estratégia política de fundo, de uma unidade ideológica e da capacidade de conectar as questões específicas às gerais, é um grande limitador dos avanços desses movimentos e da concretização de suas bandeiras.
Por outro lado, é urgente que os partidos de esquerda e as entidades estudantis e sindicais tenham a capacidade de englobar essas pautas, de forma consistente e não apenas visando um diálogo superficial com esses movimentos. O erguimento de novos padrões de relação, comportamento, conduta, valores, liberdades e felicidade para todas as pessoas é fundamental para uma nova lógica econômica e política a que se pretendem os grupos políticos de contestação tradicional.
Por fim, o quarto ponto já é o mais estudado dos três, afinal já não é de hoje e cada vez se intensifica o poder da internet sobre os debates e decisões públicas, às vezes subestimado, noutras superestimado. Levaremos um tempo para compreender exatamente o quanto as pessoas estão engajadas com as pautas que apoiam pelo computador, bem como quem e de que forma influencia e é influenciado nas redes sociais. Fica aqui apenas a verificação de que esse é o canal principal de mobilização desses movimentos que podem não ter vindo pra ficar, mas já deixaram sua novidade e sua marca e requerem atenção. Afinal, até o STF já conhece, entende e apoia essa contestação irreverente que as Marchas trouxeram ao cenário político brasileiro.
Que possamos seguir marchando, lutando, sonhando e refletindo sobre nossa caminhada, para que cada passo nos aproxime do mundo de igualdade, justiça e respeito que impulsionam nossos gritos por liberdade.
Louise Caroline Lima e Silva(@LouCarolinePE no Twitter) é mestranda em Ciência Política na UFPE, militante do PT e Secretária da Mulher na Prefeitura de Caruaru. Foi vice-presidente da UNE de 2005 a 2007.

sábado, 11 de junho de 2011

O PT e a crise do ministro Palocci


*Por Elói Pietá

Para os petistas, não sair em defesa de Palocci foi uma reação contra o risco de distanciamento do PT em relação à sua base social. Por isso estamos com a presidenta Dilma e apoiamos sua dolorosa atitude nesta hora. Mesmo tendo que perder um ministro tão importante, ou tendo que parecer vencida pela pressão das oposições, ela preferiu não perder o sentido social de seu governo.
Os petistas não contestam o direito que Palocci tinha de exercer uma atividade privada quando saiu do governo em 2006 e de ter sucesso nela. O que causou espanto e levou os petistas a não apoiarem sua permanência no governo, foi a origem de seus ganhos privados (orientar os negócios de grandes empresas), a magnitude dos resultados (dezenas de milhões de reais), e o alto padrão de vida que ele se concedeu (representado pelo investimento em moradia fora de sua própria origem de classe média).
Nós, petistas, éramos ‘de fora’ nos tornamos ‘de dentro’ do Estado brasileiro. Até hoje a elite rica ou a classe média alta de doutores não simpatiza com ver lá essa geração vinda dos movimentos de trabalhadores. Somos herdeiros dos esforços que o Partido Comunista representou ao levar em 1945 ao Parlamento trabalhadores historicamente excluídos do poder (por pouco tempo, já que logo posto na ilegalidade). Somos herdeiros daqueles que no início dos anos de 1960 ensaiaram alguma presença no Estado através de suas lideranças sindicais e de partidos socialistas nascentes (tentativa abortada com o golpe militar).
Enfrentamos com muitas dificuldades materiais as eleições. Uma após outra, elegemos homens e mulheres vereadores, deputados, prefeitos, senadores, governadores, até chegar três vezes à presidência da República. Muitos se tornaram assessores nos parlamentos, nos governos, diretores, secretários, dirigentes de empresas públicas, ministros.
Quando estávamos perto do poder ou nele, as empresas privadas ajudaram nossas campanhas e procuraram nos aproximar delas. Queremos o financiamento público dos partidos para não depender delas. Respeitamos os empresários, mas com a devida distância.
Não queremos sair do que fomos. Sabemos que as relações econômicas e as condições materiais de vida terminam moldando ideias e ações. São milenares as reflexões que alertam para isso. Vamos recordar alguns exemplos.
Lá longe, o filósofo grego Platão, em A República, dizia que os governantes das cidades-estado não deveriam possuir bens, exceto aquilo de essencial que um cidadão precisa para viver. Que deveriam ter o ouro e a prata apenas na alma, porque se fossem proprietários de terras, casas e dinheiro, de guardas que eram da sociedade se transformariam em mercadores e donos de terras, então, de aliados passariam a inimigos dos outros cidadãos.
A Revolução Francesa no fim do século 18 fez brilhar pela ação dos excluídos as ideias de igualdade, fraternidade e liberdade, contra a concentração da riqueza e do poder nos reis, na nobreza e no clero. É verdade que depois houve a restauração do Império, mas também se fortaleceram as ideias socialistas.
Marx e Engels, que buscavam a emancipação do proletariado, consideravam que, para modificar a consciência coletiva era preciso modificar a base material da atividade econômica. Não bastava, portanto, a crítica das ideias, porque o pensar das pessoas reflete seu comportamento material.
Filósofos sociais posteriores, mesmo aqueles cujas ideias deram suporte ao liberalismo, como Max Weber, falavam de estamentos sociais definidos pelos princípios de seu consumo de bens nas diversas formas de sua maneira de viver.
Já dizia Maquiavel que a política se altera no ritmo incessante das ondas do mar. Os partidos tendem a ser como estas ondas: vem de muito longe, vem crescendo, até que um dia se quebram mansamente nas praias ou mais rudemente nos rochedos. Defender vida modesta para políticos vindos da vida modesta das maiorias, é para o PT uma das condições indispensáveis para comandar um processo de distribuição da renda e inclusão das multidões excluídas, embora não a condição única. Para cumprir esta condição e nosso papel, é essencial sermos, como temos sido: fiéis, na nossa vida pessoal e política, aos milhões e milhões de brasileiros que têm votado e confiado em nós. É legítimo para nós progredir ao longo da vida, desde que todos cresçam na mesma medida em que o bem-estar do povo cresce.
Voltando ao companheiro Palocci: respeitamos suas opções, admiramos sua competência, reconhecemos seu trabalho a serviço do povo. Mas, pelas razões expostas, o PT mostrou que prefere o político de vida simples que conhecemos, ao empresário muito bem sucedido sobre o qual agora se fala.
Nesse mix de filosofias sobre a riqueza e seu reflexo no pensamento social, terminamos lembrando o imperativo categórico de Kant: aja de tal modo que a máxima de sua ação possa ser universalizada, isto é, para que todos sejam iguais a você. Por isso que, para continuarmos a ser um partido dos trabalhadores, não é bom que cultivemos o ideal de empresários.

*Elói Pietá é secretário geral nacional do PT.

sábado, 4 de junho de 2011

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Saudades - Clarice Lispector



Sinto saudades de tudo que marcou a minha vida.
Quando vejo retratos, quando sinto cheiros,
quando escuto uma voz, quando me lembro do passado,
eu sinto saudades...

Sinto saudades de amigos que nunca mais vi,
de pessoas com quem não mais falei ou cruzei...

Sinto saudades da minha infância,
do meu primeiro amor, do meu segundo, do terceiro,
do penúltimo e daqueles que ainda vou ter, se Deus quiser...

Sinto saudades do presente,
que não aproveitei de todo,
lembrando do passado
e apostando no futuro...

Sinto saudades do futuro,
que se idealizado,
provavelmente não será do jeito que eu penso que vai ser...

Sinto saudades de quem me deixou e de quem eu deixei!
De quem disse que viria
e nem apareceu;
de quem apareceu correndo,
sem me conhecer direito,
de quem nunca vou ter a oportunidade de conhecer.

Sinto saudades dos que se foram e de quem não me despedi direito!

Daqueles que não tiveram
como me dizer adeus;
de gente que passou na calçada contrária da minha vida
e que só enxerguei de vislumbre!

Sinto saudades de coisas que tive
e de outras que não tive
mas quis muito ter!

Sinto saudades de coisas
que nem sei se existiram.

Sinto saudades de coisas sérias,
de coisas hilariantes,
de casos, de experiências...

Sinto saudades do cachorrinho que eu tive um dia
e que me amava fielmente, como só os cães são capazes de fazer!

Sinto saudades dos livros que li e que me fizeram viajar!

Sinto saudades dos discos que ouvi e que me fizeram sonhar,

Sinto saudades das coisas que vivi
e das que deixei passar,
sem curtir na totalidade.

Quantas vezes tenho vontade de encontrar não sei o que...
não sei onde...
para resgatar alguma coisa que nem sei o que é e nem onde perdi...

Vejo o mundo girando e penso que poderia estar sentindo saudades
Em japonês, em russo,
em italiano, em inglês...
mas que minha saudade,
por eu ter nascido no Brasil,
só fala português, embora, lá no fundo, possa ser poliglota.

Aliás, dizem que costuma-se usar sempre a língua pátria,
espontaneamente quando
estamos desesperados...
para contar dinheiro... fazer amor...
declarar sentimentos fortes...
seja lá em que lugar do mundo estejamos.

Eu acredito que um simples
"I miss you"
ou seja lá
como possamos traduzir saudade em outra língua,
nunca terá a mesma força e significado da nossa palavrinha.

Talvez não exprima corretamente
a imensa falta
que sentimos de coisas
ou pessoas queridas.

E é por isso que eu tenho mais saudades...
Porque encontrei uma palavra
para usar todas as vezes
em que sinto este aperto no peito,
meio nostálgico, meio gostoso,
mas que funciona melhor
do que um sinal vital
quando se quer falar de vida
e de sentimentos.

Ela é a prova inequívoca
de que somos sensíveis!
De que amamos muito
o que tivemos
e lamentamos as coisas boas
que perdemos ao longo da nossa existência...

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

PT 31 Anos - Os Filhos da Paixão


Este poema de Hamilton Pereira, o Pedro Tierra, é uma das coisas mais lindas que eu já li na vida. Tô sempre lendo e repassando. Lembro-me até hoje a 1ª vez que tive contato com ele- fazendo a leitura do Caderno das Resoluções do II Congresso Nacional do PT. Pedro Tierra sobreviveu às torturas dos porões da ditadura na década de 70. Faz parte do Conselho da Fundação Perseu Abramo.

Este poema histórico fala de força, união, cooperação, solidariedade e da teia de sonhos entrelaçados no nascer de uma estrela., que guiou a luta operária no país.

É com ele que eu presto minha singela homenagem aos milhões de companheiras e companheiras que dedicaram e dedicam os melhores anos das suas vidas à construção desse nosso sonho.

É com ele que eu externo a minha imensa alegria e orgulho de fazer parte do Partido dos Trabalhadores!

Viva o PT,

Viva o Brasil!

Os Filhos da Paixão

Nascemos num campo de futebol.
Haverá berço melhor para dar à luz uma estrela?
Aprendemos que os donos do país só nos ouviam
quando cessava o rumor da última máquina...
quando cantava o arame cortado da última cerca.
Carregamos no peito, cada um, batalhas incontáveis.
Somos a perigosa memória das lutas.
Projetamos a perigosa imagem do sonho.

Nada causa mais horror à ordem
do que homens e mulheres que sonham.
Nós sonhamos. E organizamos o sonho.
Nascemos negros, nordestinos, nisseis, índios,
mulheres, mulatas, meninas de todas as cores,
filhos, netos de italianos, alemães, árabes, judeus,
portugueses, espanhóis, poloneses, tantos...

Nascemos assim, desiguais, como todos os sonhos humanos.
Fomos batizados na pia, na água dos rios, nos terreiros.
Fomos, ao nascer, condenados a amar a diferença.
A amar os diferentes.

Viemos da margem.
Somos a anti-sinfonia
que estorna da estreita pauta da melodia.
Não cabemos dentro da moldura...
Somos dilacerados como todos os filhos da paixão.
Briguentos. Desaforados. Unidos. Livres:
como meninos de rua.

Quando o inimigo não fustiga
inventamos nossas próprias guerras.
Desenvolvemos um talento prodigioso para elas.
Com nossas mãos, sonhos, desavenças compomos um rosto de peão,
uma voz rouca de peão,
o desassombro dos peões para oferecer ao país,
para disputar o país.

Por sua boca dissemos na fábrica, nas praças, nos estádios
que este país não tem mais donos.
Em 84 viramos multidão, inundamos as ruas,
somamos nosso grito ao grito de todos,
depois gritamos sozinhos
e choramos a derrota sob nossas bandeiras.
88. Como aprender a governar,
a desenhar em cada passo, em cada gesto,
a cada dia a vida nova que nossa boca anunciou?

89. Encarnamos a tempestade.
Assombrados pela vertigem dos ventos que desatamos.
Venceu a solidez da mentira, do preconceito.
Três anos depois, pintamos a cara como tantos
e fomos pra rua com nossos filhos
inventar o arco-íris e a indignação.

Desta vez a fortaleza ruiu diante dos nossos olhos.
E só havia ratos depois dos muros.
A fortaleza agora está vazia
ou povoada de fantasmas.

O caminho que conduz a ela passa por muitos lugares.
Caravanas: pelas estradas empoeiradas,
pela esperança empoeirada do povo,
pelos mandacarus e juazeiros,
pelos seringais, pelas águas da Amazônia,
pelos parreirais e pelos pampas, pelos cerrados e pelos babaçuais,
mas sobretudo pela invencível alegria
que o rosto castigado da gente demonstra à sua passagem.
A revolução que acalentamos na juventude faltou.

A vida não. A vida não falta.
E não há nada mais revolucionário que a vida.
Fixa suas próprias regras.
Marca a hora e se põe de nós, incontornável.
Os filhos da margem têm os olhos postos sobre nós.
Eles sabem, nós sabemos que a vida não nos concederá outra oportunidade.
Hoje, temos uma cara. Uma voz. Bandeiras.
Temos sonhos organizados.

Queremos um país onde não se matem crianças
que escaparam do frio, da fome, da cola de sapateiro.
Onde os filhos da margem tenham direito à terra,
ao trabalho, ao pão, ao canto, à dança,
às histórias que povoam nossa imaginação,
às raízes da nossa alegria.

Aprendemos que a construção do Brasil
não será obra apenas de nossas mãos.
Nosso retrato futuro resultará
da desencontrada multiplicação
dos sonhos que desatamos.

Pedro Tierra
1994

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Soul Parsifal - (Renato Russo e Marisa Monte)



Ninguém vai me dizer o que sentir
Meu coração está desperto
É sereno nosso amor e santo este lugar
Dos tempos de tristeza tive o tanto que era bom
Eu tive o teu veneno
E o sopro leve do luar

Porque foi calma a tempestade
E tua lembrança, a estrela a me guiar
Da alfazema fiz um bordado
Vem, meu amor, é hora de acordar

Tenho anis
Tenho hortelã
Tenho um cesto de flores
Eu tenho um jardim e uma canção
Vivo feliz, tenho amor
Eu tenho um desejo e um coração
Tenho coragem e sei quem eu sou

Eu tenho um segredo e uma oração
Vê que a minha força é quase santa
Como foi santo o meu penar
Pecado é provocar desejo
E depois renunciar

Estive cansado
Meu orgulho me deixou cansado
Meu egoísmo me deixou cansado
Minha vaidade me deixou cansado
Não falo pelos outros
Só falo por mim
Ninguém vai me dizer o que sentir

Tenho jasmim tenho hortelã
Eu tenho um anjo, eu tenho uma irmã
Com a saudade teci uma prece
E preparei erva-cidreira no café da manhã
Ninguém vai me dizer o que sentir
E eu vou cantar uma canção p'rá mim

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

MAIS uma indicação da Lou!



Problemas da esquerda

Marcelo Mário de Melo

Os problemas e as soluções que desafiam a esquerda brasileira estão ligados às seguintes esferas: rima, fotografia, mecânica, televisão, geometria, avicultura, sexualidade, fantasmagoria, referências, realismo, culinária, trânsito, jardinagem, estratégia e tática.

Rima – Pedro Álvares Cabral, colônia de Portugal, império nacional – pessoal, regencial, república de marechal, ato adicional, ato institucional, abertura gradual, anistia parcial, eleição colegial, constituinte congressual, presidência imperial, corrupção visceral. É pau. É pau. É pau. Liberal. Liberal.Liberal. É só mudar a rima.

E é preciso ter muito cuidado a cada instante para não rimar nunca, militante, com arrogante.

Fotografia – Quando utilizamos uma câmera fotográfica, girando à esquerda, proporcionamos mais abertura e mais luz e, à direta, o contrário. Se projetos e ações não seguem este parâmetro, algo deve estar errado.

Mecânica - Há aqueles que, muitas vezes, não conseguem fazer a distinção entre o parafuso e o prego, ou entre os momentos de prego e de parafuso. Chegado o momento de torcer, e com cuidado, põem-se a bater. E na hora de bater com decisão, põem-se a torcer. O resultado são roscas estragadas, pregos perdidos e muitos dedos atingidos.Até o dia em que afinal se entenda que em parafuso e em rosca não se bate e que sem pancada não se põe um prego, ainda, quantos dedos amassados?

Televisão – A programação ao vivo deve superar a em circuito fechado. Para que não predominem o cupulismo e os seus subprodutos: comunista cinco estrelas, o social-democrata de cobertura, o liberal de sala vip, o anarquista de salão, o agitador de corredor, o ativista de sala de espera, o cacique jovem guarda, o precandidato a cacique, a liderança de outdor e a transparência com vidro fumê.

Geometria – Quadrado, polígono, triângulo, círculo e elipse enclausuram os passos e a visão. Mas o círculo espiral não é vicioso círculo em torno de si mesmado numa rotação que amarra. Ele circula crescente, roto-translacional, deixando aberta e andante a porta que engole espaços. Ele cresce e é engolido pelos espaços que engole, não havendo nos seus giros a fronteira dentro e fora. Pelo movimento espiral.

Avicultura – Não temos nada e adquirimos uma codorninha. Quanto pior, pior, quanto melhor, melhor. Mas sem conformismo. Não chamar codorninha de galeto. Nem galeto de capão gordo. Nem capão gordo de peru. Nem peru de pavão. E não esquecer que o objetivo é o pavão.

Sexualidade – Liberalismo, neoliberalismo, é masturbação sem gozo. Social-democracia é gozar fora e em pé. Socialismo stalinista é transar sem sarro e, muitas vezes, sobre cama de caco de vidro e areia. Socialismo com cidadania popular, pluralismo e controle civil, é sarro, dança, gozo dentro, conjunto e muitas vezes repetido em boa cama. E radicalidade: vaselina somente para aumentar a profundidade.

Fantasmagoria – Exorcizar o trio tenebroso: mito, dogma, utopia. Mito é a sombra do anão fazendo gigante no muro. Dogma é a ponte avançando antes de o rio nascer. Utopia é a costura seguindo sem a linha na agulha. Abaixo MDU!

Referências - A esperança crítica, mais além de otimismo e pessimismo; a megalomania moderada - grandes projetos com um redutor; o narcisismo com espelho retrovisor, para que todos possam ver a própria cauda. Sem confundir processo histórico com processo histérico, referência com reverência, paradigma com paradogma e sociedade civil com construção civil, à base de premoldados.

Realismo pus e seiva – Apreender o real tal qual viceja ou apodrece, com o reconhecimento trialético dos saltos qualitativos pra a frente e pra trás, quando a quantidade ruim se transforma em qualidade pior, determinando o momento de sair de perto, tampar o nariz ou dar a descarga.

Culinária – Receita, somente de bolo.

Trânsito - Sempre à esquerda, não ultrapasse pela direita.

Jardinagem - Deixa a massa andar na praça. Depois se fazem os canteiros.

Estratégia e tática – Pela militância quadrilateral: contra a fome, o raquitismo, a subnutrição cultural e a corrupção visceral. Por uma militância com poesia, prazer, amizade e humor.

Sobre reuniões - Indicação de Louise Caroline

REUNIÕES/REUNIÕES

Marcelo Mário de Melo

No primeiro ponto da reunião

se estabelece

o cronograma

das reuniões.

No segundo ponto

a competência

das reuniões.

No terceiro ponto

o funcionamento

da reunião.

No quarto ponto

a pauta

da reunião.

No quinto ponto

se faz a síntese

dos tópicos anteriores.

O penúltimo ponto

é para deliberar sobre

a prorrogação da reunião.

No último ponto se discute

se haverá ou não

uma reunião

extraordinária.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Motel público para juventude! e Chega de pia de banheiro! Por Ramon Szermeta




Você que é leitor(a) dessa revista, com certeza não deve se achar conservador(a). Você provavelmente se considera de esquerda, votou no Lula nas últimas eleições, deve ser jovem, talvez se considere socialista, em alguns casos até libertário(a), etc, etc… Então pense na seguinte situação: seu pai se separa da sua mãe e lhe dá a notícia que, depois de

muitos anos casado, descobriu que é gay e agora vai viver com outro homem debaixo do mesmo teto, pois é assim que ele é feliz. Você com certeza vai achar normal. Contará para todos seu amigos e tratará o novo amor do seu “velho” normalmente. Não é caro leitor? Você que acha que toda forma de amor vale a pena, que é contra o preconceito e a discriminação vai encarar o fato na boa, não é? Que bom! Pois o exercício acima foi para tocarmos em um assunto pouco habitual, não só nas discussões que nós, da Juventude do PT, fazemos, como num tema que a sociedade pouco explora, ao menos de forma séria, que é a sexualidade da juventude. Nos despirmos de preconceitos e estigmas é o primeiro passo para começarmos a fazer um bom debate.

Não precisamos nos rechear de dados aqui para saber que o jovem inicia sua vida sexual cada vez mais cedo, que o índice de jovens contaminados pelo HIV no mundo é assustador e o drama da gravidez precoce indesejada é uma realidade constante. Antes

de propormos a famosa solução da abstinência sexual, o que tem se mostrado falho, devemos reconhecer o jovem como um sujeito de suas ações, capaz de tomar decisões e encarar suas escolhas. A sociedade deve estar preparada e aceitar o fato dos jovens iniciarem sua vida sexual mais cedo do que deseja sua família, sua escola ou o Estado. Ou seja, deve dar condições para tomar sua decisão de forma consciente.

Antes que se fale da banalização do sexo nos meios de comunicação, (o que não está banalizado?), da pornografia da novela das oito ou do apelo sexual de boa parte das propagandas, devemos ter clareza que ainda não há uma política séria de educação sexual nas escolas. Por incrível que pareça, muitos jovens não tem informações básicas sobre os métodos preventivos e a maioria pouco conhece seu corpo (principalmente as mulheres). A omissão e ineficácia do Estado nessa questão ainda são espantosas e por isso devemos intensificar debates sobre esse tema nos espaços mais variados, propondo e cobrando dos governos ações nesse campo.

Devemos considerar a educação sexual como um elemento de formação do cidadão. Afinal, sua vida sexual mexe com seu lado psicológico, emocional e com sua auto-estima. A preocupação com os jovens que ainda estão iniciando várias experiências na vida deve ser redobrada e devemos formular propostas para o poder público que contribuam para que o jovem tenha uma vida sexual saudável. O que com certeza implica em uma política que envolva áreas da saúde, educação, comunicação e principalmente envolva o jovem na construção dessa política.

OK, talvez você concorde com quase tudo. Mas já parou para pensar em que condições a maioria dos jovens fazem sexo hoje? Talvez escondido em casa enquanto os pais trabalham? E os que têm pais desempregados? No banheiro de uma festa? Atrás do muro da escola? Terrenos baldios, construções abandonadas? Será que essas situações são as mais adequadas para pura e simplesmente desfrutar dos prazeres que se pretende? E para, por exemplo, usar camisinha? Ou então imaginem uma abordagem da nossa tão refinada polícia flagrando dois jovens nessa situação? Pois, por mais que não pareça essa é uma aflição que atinge muito jovens e por ser considerada um problema individual não existem propostas que enfrentem esse problema.

Talvez porque quem mais sinta isso na pele são jovens das camadas mais pobres da população. Sem falar, obviamente, no conservadorismo, na hipocrisia ou no falso moralismo que ainda predominam na nossa sociedade.

Dada essa situação, acredito que devemos começar seriamente a desenvolver uma idéia que pintou em alguns debates, que diz respeito à construção de “Motéis públicos para a Juventude”.

Claro que todo governo terá sempre outras prioridades, muitos não levarão a proposta a sério, a Liga das Senhoras Católicas vai dar chilique, e o seu pai (aquele que eu pedi pra você pensar no início) vai achar um absurdo. Mas cabe a nós, da Juventude do PT, buscar soluções para os mais variados anseios e aflições da juventude brasileira. Não devemos temer propostas polêmicas que busquem encarar o problema de frente. Está lançado o desafio e espero que o enfrentemos, com muito prazer!!!

Ramon Szermeta, Secretário Estadual de Juventude do PT/SP (2001-08)

Marisa Letícia Lula da Silva: as palavras que precisavam ser ditas - Por Hildegard Angel




Foram oito anos de bombardeio intenso, tiroteio de deboches, ofensas de todo jeito, ridicularia, referências mordazes, críticas cruéis, calúnias até. E sem o conforto das contrapartidas. Jamais foi chamada de "a Cara" por ninguém, nem teve a imprensa internacional a lhe tecer elogios, muito menos admiradores políticos e partidários fizeram sua defesa. À "companheira" número 1 da República, muito osso, afagos poucos. Ah, dirão os de sempre, e as mordomias? As facilidades? O vidão? E eu rebaterei: E o fim da privacidade? A imprensa sempre de olho, botando lente de aumento pra encontrar defeito? E as hostilidades públicas? E as desfeitas? E a maneira desrespeitosa com que foi constantemente tratada, sem a menor cerimônia, por grande parte da mídia? Arremedando-a, desfeiteando-a, diminuindo-a? E as frequentes provas de desconfiança, daqui e dali? E - pior de tudo - os boatos infundados e maldosos, com o fim exclusivo e único de desagregar o casal, a família? Ah, meus queridos, Marisa Letícia Lula da Silva precisou ter coragem e estômago para suportar esses oito anos de maledicências e ataques. E ela teve.
Começaram criticando-a por estar sempre ao lado do marido nas solenidades. Como se acompanhar o parceiro não fosse o papel tradicional da mulher mãe de família em nossa sociedade. Depois, implicaram com o silêncio dela, a "mudez", a maneira quieta de ser. Na verdade, uma prova mais do que evidente de sua sabedoria. Falar o quê, quando, todos sabem, primeira-dama não é cargo, não é emprego, não é profissão? Ah, mas tudo que "eles" queriam era ver dona Marisa Letícia se atrapalhar com as palavras para, mais uma vez, com aquela crueldade venenosa que lhes é peculiar, compará-la à antecessora, Ruth Cardoso, com seu colar poderoso de doutorados e mestrados. Agora, me digam, quantas mulheres neste grande e pujante país podem se vangloriar de ter um doutorado? Assim como, por outro lado, não são tantas as mulheres no Brasil que conseguem manter em harmonia uma família discreta e reservada, como tem Marisa Letícia. E não são também em grande número aquelas que contam, durante e depois de tantos anos de casamento, com o respeito implícito e explícito do marido, as boas ausências sempre feitas por Luís Inácio Lula da Silva a ela, o carinho frequentemente manifestado por ele. E isso não é um mérito? Não é um exemplo bom?
Passemos agora às desfeitas ao que, no entanto, eu considero o mérito mais relevante de nossa ex-primeira-dama: a brasilidade. Foi um apedrejamento sem trégua, quando Marisa Letícia, ao lado do marido presidente, decidiu abrir a Granja do Torto para as festas juninas. A mais singela de nossas festas populares, aquela com Brasil nas veias, celebrando os santos de nossas preferências, nossa culinária, os jogos e brincadeiras. Prestigiando o povo brasileiro no que tem de melhor: a simplicidade sábia dos Jecas Tatus, a convivência fraterna, o riso solto, a ingenuidade bonita da vida rural. Fizeram chacota por Lula colar bandeirinhas com dona Marisa, como se a cumplicidade do casal lhes causasse desconforto. Imprensa colonizada e tola, metida a chique. Fazem lembrar "emergentes" metidos a sebo que jamais poderiam entender a beleza de um pau de sebo "arrodeado" de fitinhas coloridas. Jornalistas mais criteriosos saberiam que a devoção de Marisa pelo Santo Antônio, levado pelo presidente em estandarte nas procissões, não é aprendida, nem inventada. É legitimidade pura. Filha de um Antônio (Antônio João Casa), de família de agricultores italianos imigrantes, lombardos lá de Bérgamo, Marisa até os cinco de idade viveu num sítio com os dez irmãos, onde o avô paterno, Giovanni Casa, devotíssimo, construiu uma capela de Santo Antônio. Até hoje ela existe, está lá pra quem quiser conferir, no bairro que leva o nome da família de Marisa, Bairro dos Casa, onde antes foi o sítio de suas raízes, na periferia de São Bernardo do Campo. Os Casa, de Marisa Letícia, meus amores, foram tão imigrantes quanto os Matarazzo e outros tantos, que ajudaram a construir o Brasil.
Outro traço brasileiro dela, que acho lindo, é o prestígio às cores nacionais, sempre reverenciadas em suas roupas no Dia da Pátria. Obras de costureiros nossos, nomes brasileiros, sem os abstracionismos fashion de quem gosta de copiar a moda estrangeira. Eram os coletes de crochê, os bordados artesanais, as rendas nossas de cada dia. Isso sim é ser chique, o resto é conversa fiada. No poder, ao lado do marido, ela claramente se empenhou em fazer bonito nas viagens, nas visitas oficiais, nas cerimônias protocolares. Qualquer olhar atento percebe que, a partir do momento em que se vestir bem passou a ser uma preocupação, Marisa Letícia evoluiu a cada dia, refinou-se, depurou o gosto, dando um olé geral em sua última aparição como primeira-dama do Brasil, na cerimônia de sábado passado, no Palácio do Planalto, quando, desculpem-me as demais, era seguramente a presença feminina mais elegante. Evoluiu no corte do cabelo, no penteado, na maquiagem e, até, nos tão criticados reparos estéticos, que a fizeram mais jovem e bonita. Atire a primeira pedra a mulher que, em posição de grande visibilidade, não fez uma plástica, não deu uma puxadinha leve, não aplicou uma injeçãozinha básica de botox, mesmo que light, ou não recorreu aos cremes noturnos. Ora essa, façam-me o favor!
Cobraram de Marisa Letícia um "trabalho social nacional", um projeto amplo nos moldes do Comunidade Solidária de Ruth Cardoso. Pura malícia de quem queria vê-la cair na armadilha e se enrascar numa das mais difíceis, delicadas e técnicas esferas de atuação: a área social. Inteligente, Marisa Letícia dedicou-se ao que ela sempre melhor soube fazer: ser esteio do marido, ser seu regaço, seu sossego. Escutá-lo e, se necessário, opinar. Transmitir-lhe confiança e firmeza. E isso, segundo declarações dadas por ele, ela sempre fez. Foi quem saiu às ruas em passeata, mobilizando centenas de mulheres, quando os maridos delas, sindicalistas, estavam na prisão. Foi quem costurou a primeira bandeira do PT. E, corajosa, arriscou a pele, franqueando sua casa às reuniões dos metalúrgicos, quando a ditadura proibiu os sindicatos. Foi companheira, foi amiga e leal ao marido o tempo todo. Foi amável e cordial com todos que dela se aproximaram. Não há um único relato de episódio de arrogância ou desfeita feita por ela a alguém, como primeira-dama do país. A dona de casa que cuida do jardim, planta horta, se preocupa com a dieta do maridão e protege a família formou e forma, com Lula, um verdadeiro casal. Daqueles que, infelizmente, cada vez mais escasseiam.
Este é o meu reconhecimento ao papel muito bem desempenhado por Marisa Letícia Lula da Silva nesses oito anos. Tivesse dito tudo isso antes, eu seria chamada de bajuladora. Esperei-a deixar o poder para lhe fazer a Justiça que merece.